domingo, 7 de agosto de 2011

Amorim e as Forças Armadas - Análise

Da Rede Brasil Atual

São Paulo – O ex-chanceler Celso Amorim não terá dificuldades na relação com os militares caso assuma o compromisso de investir na atualização dos equipamentos das Forças Armadas. Thomas Heye, professor da Universidade Federal Fluminense (UFF), acredita que Nelson Jobim, demitido na quinta-feira (5), deixou um caminho bem pavimentado no Ministério da Defesa.

“O que Amorim tem de fazer, basicamente, é resgatar a capacidade de o país investir na sua própria defesa. Conseguindo fazer isso, consegue se legitimar perante as Forças Armadas e vai avançar em uma questão que é fundamental para a sociedade”, afirma Heye, que não acredita que a troca de ministro significará a ruptura deste acordo.

Um dos trunfos de Jobim desde a posse no cargo, em julho de 2007, foi a formulação de projetos a longo prazo, a ponto de ser considerado por alguns representantes das forças militares do país como o primeiro ministro da Defesa de fato. Foi criado, por exemplo, o Sistema Integrado de Monitoramento de Fronteiras, que prevê um investimento bilionário ao longo desta década na proteção das áreas vizinhas a outras nações. 

Além disso, Jobim colocava como um dos pontos centrais de sua gestão a compra de aviões caças para modernizar a atual frota brasileira. Heye não acredita que o fato de haver sido novamente adiada pelo governo Dilma Rousseff a compra destas aeronaves possa ter servido como motivo para a irritação de Jobim, que nas últimas semanas afiou ainda mais seu discurso, passando a desafiar e a criticar colegas de governo.

O ápice se deu na quinta-feira, quando foram divulgados trechos de entrevista à revista Piauí na qual o ex-ministro chamava a titular de Relações Institucionais, Ideli Salvatti, de “fraquinha”, e pontuava que a chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, “nem sequer conhece Brasília”. 

Para o professor, a compra dos caças resta em aberto, havendo sofrido apenas um adiamento por conta dos cortes promovidos este ano no Orçamento do governo federal. “O adiamento não foi ruim para nós. Com o agravamento da crise internacional, os termos deste acordo podem até mesmo melhorar para o Brasil.”

Histórico

Amorim, de 69 anos, foi titular do Ministério das Relações Exteriores durante todo o governo Lula, e é considerado o responsável pela condução de uma política externa exitosa, que aumentou a projeção política do Brasil e sua capacidade de negociação, aliados ao crescimento de escala econômica do país. O Itamaraty sob a gestão de Amorim posicionou-se sempre a favor de resoluções internacionais que respeitassem o princípio da autodeterminação dos povos, evitando interferência em temas considerados de foro interno.

“Ele tem uma perspectiva ideológica da atuação internacional que vai ecoar de maneira bastante positiva dentro das Forças Armadas”, pondera Heye, mostrando uma visão diferente da de alguns analistas políticos e colunistas da velha imprensa, que pontuaram que a política externa “ideológica” conduzida pelo ex-chanceler era malvista dentro da caserna.

O professor também não acredita que o passado conflitoso da relação entre militares e Amorim poderá ser um problema. Em 1979, ele foi indicado ao Ministério da Educação para assumir a Embrafilme, agência de promoção do cinema nacional, e acabou demitido por financiar filmes que não agradaram ao gosto dos comandantes das Forças Armadas.

Neste momento, discute-se a aprovação no Congresso da Comissão da Verdade, que vai apurar os crimes cometidos pela ditadura (1964-85) e, a princípio, também os realizados no período entre 1946 e o golpe de Estado. O Palácio do Planalto trabalha com a expectativa de aprovar o projeto neste semestre. Durante os primeiros meses do novo governo, o trabalho de Dilma foi o de unificar o discurso e de garantir que desaparecesse a resistência castrense à criação do órgão. Acredita-se que esta negociação teve em Jobim uma figura fundamental para eliminar dissidências. 

“Por enquanto, o caminho está pavimentado. O papel da comissão a gente só vai poder julgar quando estiver instaurada. E a expectativa da sociedade é muito grande”, aponta Heye. Ou seja, só se sabe o quanto Amorim terá de negociar com as Forças Armadas neste sentido quando a comissão estiver de fato instaurada.


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