Valter Foleto Santin, da Promotoria do Patrimônio Público e
Social, acredita que a privatização da Praça da Flores, na Mooca, em São
Paulo, é prejudicial à população
São Paulo – Um inquérito civil movido pela Promotoria do Patrimônio
Público e Social, do Ministério Público Estadual de São Paulo, apura a
venda de bens públicos à iniciativa privada realizada pela prefeitura de
São Paulo desde o ano passado. Ontem
(11), em audiência pública, o promotor Valter Foleto Santin, ouviu
integrantes da Associação
de Moradores e Amigos da Mooca (Amo a Mooca), que se mobilizam para
barrar a privatização da praça Alfredo di Cunto, a
Praça das Flores, na zona leste de São Paulo. Santin pode entrar com
ação civil pública para impedir a operação.
A praça da Mooca é uma das 20
áreas municipais que a prefeitura deseja comercializar. Pelo projeto
municipal (271/2011), as empresas que adquirirem esses terrenos terão
de construir
creches, criando 45 mil vagas na
cidade, segundo o Executivo. Os imóveis já estão liberados para a venda.
Outro terreno que integra o projeto é o de um
quarteirão de serviços do Itam Bibi, na zona sul de São Paulo,
cuja venda está impedida pela Justiça.
A Amo a
Mooca é contrária à venda da praça. Para o movimento, o projeto de
creches não beneficiaria o bairro especificamente, e a praça é
uma das poucas áreas verdes da Mooca, segundo bairro menos
arborizado da cidade, perdendo apenas para o Itaim Paulista, também
na zona leste. Na Praça das Flores, cursos de jardinagem e de hortas
caseiras são ministrados gratuitamente.
O prefeito Gilberto Kassab (PSD) disse, em ofício
enviado à Câmara dos Vereadores, no ano passado que a valorização
imobiliária da área é incontestável, e a Secretaria de Finanças
estima que sejam arrecadados R$ 4,3 milhões com a venda. Mas para o promotor Santin, não faz
sentido desfazer-se de patrimônio público para construir creches ou
para enriquecer cofres públicos. Em entrevista à Rede Brasil Atual ele afirma que o dinheiro arrecadado com a venda dos
terrenos pode nem chegar aos cofres públicos.
Como o sr. avalia o projeto da prefeitura de vender terrenos públicos e utilizar os recursos para a construção de creches?
A lei
não especifica que esse dinheiro será usado pra construir
creches. Não tem uma garantia. Ninguém é contra construção de
creche, ao contrário, há de se construí-las, mas não precisa
vender patrimônio municipal para isso. Tem dinheiro no Orçamento e
há projetos do governo federal que poderiam ser aproveitados. E tem
outro aspecto mais importante: há uma posição do setor de
precatórios do Tribunal de Justiça de São Paulo recomendando que a
prefeitura use o valor adquirido por esses imóveis para pagá-los.
Então o dinheiro
arrecadado por esses terrenos poderá ser destinado aos credores do
município?
Sim. E quem tem crédito
de precatórios poderá adquirir com eles esses terrenos. Pode ser
que alguém em um eventual leilão apresente o valor do lance da
proposta, por meio de crédito de precatórios. E em leilão, a gente
sabe que o imóvel pode ser adquirido com preço bem inferior àquele
que está no aguardo do pagamento. Pode ser que no fim das contas,
esse dinheiro nem entre no caixa, quanto mais servir para construir
creche.
Qual é a
necessidade de vender a Praça das Flores?
Eu não tenho nenhuma
explicação lógica para isso. A posição da promotoria é que essa
venda é desnecessária. No meu modo de entender, ela não atende ao
interesse público. Não tem sentido vendê-la. Se esse terreno está
vago, por algum motivo, tem de fazer alguma coisa em benefício da
população. Se for para mexer tem de servir para algum
bem comunitário, ou deve ser mantido como praça. A Mooca,
especificamente, é um dos locais da cidade que tem menos área
verde, com 0,35 metros quadrados por habitante. Se for fazer alguma
coisa com esse terreno tem de ser feito com essa perspectiva, para
melhorar a vida dessas pessoas, que vivem em um ambiente degradado, em
condições muito ruins de arborização. Não dá para vendê-lo
para a eventual construção de condomínios. Tem também uma questão
urbanística: não dá para aumentar o adensamento desse local, que já é
bem alto.
Além dessa praça, há
outros 19 terrenos públicos que podem ser vendidos. Os outros casos são diferentes do da Mooca?
O poder público tem de
usar esses terrenos para beneficiar de alguma forma a população,
não simplesmente vender e se desfazer do patrimônio. A cidade carece de construção de praça, de aumento de área verde
verde, de equipamentos culturais. Até mesmo creches podem ser
construídas neles, se for o caso. É questão de avaliar as
necessidades. É também preciso pensar no futuro. Se no momento não tem nenhum projeto pra eles, no
futuro pode ter. A população cresce e as necessidades crescem. No
serviço público, elas são sempre crescentes. Vender agora para
comprar depois? Não tem sentido isso.
O sr. pretende mover uma ação civil pública?
Eu não gosto de
antecipar o que eu vou fazer. Estou avaliando juridicamente. Os
moradores pedem que não seja vendido, e a promotoria está com esse
inquérito civil em andamento.
Se o fizer, de
quais argumentos o sr. deve fazer uso?
Basicamente, o mais
importante é que não atende a interesse público, que é uma
inconstitucionalidade material que essa lei afetou. A despeito da
Câmara de Vereadores dizer que é de interesse público, no meu modo
de entender, desfazimento do patrimônio da municipalidade não o é.
Todo o mais gravita no fato da venda não ter razão lógica, de ela
não beneficiar a população. É prejudicial à população a venda
desses imóveis. E também pode não acrescentar nada aos cofres
públicos. Quem tem créditos precatórios tem de receber, mas não
com terreno que está aí para o povo utilizar de alguma forma.
Outros inquéritos
devem ser abertos por conta dos outros terrenos? O sr. acompanha
o caso do quarteirão do Itaim Bibi?
No Itaim tem uma ação
popular em andamento, com liminar, impedindo o município de vender. Tem
de esperar o que o juiz vai decidir no caso. Temos um inquérito
civil em andamento, mas estamos acompanhando a ação popular, para
ver se há necessidade ou não de entrar com uma ação e esperamos
por um momento oportuno. Provavelmente, vamos fazer outras audiências
públicas. Talvez a próxima seja na Barra Funda. Estamos
avaliando essa audiência de ontem para ver a conveniência
de fazer uma nova audiência em outras locais. O terreno da Mooca é
o que está mais próximo da venda.
A manifestação da
Amo a Mooca pode ser bem sucedida?
É importante que a
população saiba dessas propostas de venda e se mobilize. É
importante que as pessoas se conscientizem e não fiquem só esperando que
o Ministério Público faça alguma coisa. Elas têm de manifestar
que estão descontentes com essas situações e se articular para
evitá-las.
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