quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

O Filho do Brasil

Nesta semana tive a oportunidade de assistir ao filme LULA, O FILHO DO BRASIL. Como antes de ir, li e ouvi comentários de todos os tipos, fui ao cinema tentando não criar nenhuma expectativa pelo filme. De outras vezes em temas diversos fiquei frustrado por esperar um grande filme e me deparar somente com um filme. Vários são os exemplos.

Desta vez isolei todas as críticas, argumentos e comentários para ter o impacto de alguém que nada havia visto ou lido a respeito. Confesso, foi um exercício difícil, mas acho que consegui. Enfim.... lá estávamos eu, Ismenia e minha mãe. Pouca gente no cinema. Afinal era uma terça-feira à noite e parece que o povo de Salto prefere assistir filmes em outra cidade, não por aqui.

O filme retrata a história de Lula nos seus primeiros 34 anos de vida. Baseado em um livro, a tentativa do diretor foi a de individualizar a história de alguém que sempre atuou no coletivo. Todo o enredo está centrado na relação dele com a mãe (por sinal uma atuação magnífica da Glória Pires). Um recorte que ficou muito bonito, apesar de um tanto quanto romantizado. Nada contra romance. Adoro romances. Mas é que conhecendo a história dos ambientes e intervenções que Lula atuou e fez, ficou nítido para mim que a preocupação dos roteiristas e direção não era com a história social ou o contexto vivido por ele. Mas a vida dele.

E o filme justifica seu nome: O FILHO DO BRASIL. É significativa a força das imagens do que Lula, seus irmãos e sua mãe passaram desde seu nascimento até a morte da mãe. A vida dura do sertão, o machismo de seu pai, as dificuldades para chegar em "sumpaulo", a luta pela sobrevivência, as enchentes por que passaram, o Lula inteligente e estudioso que consegue graças a isso um diploma do SENAI, como ele vai parar na luta sindical, seu primeiro casamento curto e intenso, a perda do dedo, o negociador que se molda desde o início de sua militância e o lider sindical que revolucionou o movimento entre 1977 e 1981 (o filme pára em 1979, quando sua mãe Lindu morre).

Apesar de o filme usar muitas imagens reais da época da repressão, o enfoque sindical ou da liderança do Lula é pincelado. Para quem não conhece nada dessa história ele serve para aguçar a vontade de conhecer mais. Para quem conhece, a vontade de ver mais dessa história na tela. Nesse aspecto a cena mais forte sem dúvida é da primeira assembléia no estádio de futebol da Vila Euclides em São Bernardo. Nessa assembléia o sindicato não tinha ainda equipamento de som pois até então não era acostumado com grandes assembléias. E Lula diante de milhares de metalúrgicos se utiliza de uma técnica simples depois que alguém pensa nela: Seu discurso é repassado daqueles que estão perto dele para os de trás e assim sucessivamente até chegar a todos. Essa cena, confesso, me arrepiou. Talvez porque já tenha sentido na pele o calor e a efervescência que é uma assembléia. Nessa cena também muitas imagens da época, como os helicópteros sobrevoando o estádio lotado de metalúrgicos.

O filme procura mostrar a simplicidade de raciocínio e como essa simplicidade pode ser radical. No primeiro discurso de Lula como presidente do sindicato, duas frases marcam isso, pensando o que veio depois: "não somos inimigo dos patrões... afinal são eles que pagam os nossos salários" e "trabalhador não é de esquerda e muito menos de direita. Trabalhador quer e precisa sustentar sua família." E a radicalidade desses conceitos vem logo em seguida quando toda a categoria pára tentando negociar melhores salários e a repressão cerca o sindicato e destitui toda a diretoria. Nesse momento, Lula resolve dar um passo atrás e não ir para o confronto. E é chamado de "traíra" por um dos seus companheiros. O que lhe vem à mente é uma frase de sua mãe: "você sempre precisa saber o que fazer e se pode fazer. Se não puder fazer não faça... se prepare e faça depois". O filme não mostra, mas foi exatamente isso que aconteceu: na greve seguinte os patrões negociaram.

Aliás, o prédio do sindicato usado nas filmagens é o dos Metalúrgicos de São Bernardo, anos seguintes chamado de Metalúrgicos do ABC (aliás contra a vontade de Lula - isso poucos sabem).

Quem está lendo este post já percebeu que não consigo me desvencilhar da história política do movimento sindical e o que Lula representou nela. "Quem fuma cachimbo tem a boca torta".... A contradição está expressa nas linhas anteriores. Disse que o filme não foca muito a história do movimento, mas até agora só falei das partes em que o movimento é o foco. Perdoem, mas vendo o filme, toda a minha história também passou pela minha mente, como um filme.

Não sei se ainda há tempo, mas quem não assistiu esse filme deve assistir. Não se preocupem: ele não é político, nem muito menos eleitoral. A vida política de Lula nesse filme talvez seja algo em torno de 10%, ou jogando alto 20% do que ele fez. O forte do filme é a demonstração do que é um filho do Brasil, de muitos filhos do Brasil que na época subiam nos paus de araras para ter uma vida melhor na cidade grande. O forte do filme é a relação mãe/filhos e de uma mãe que percebe em um de seus filhos um "predestinado" (apesar de eu não acreditar nisso). O forte do filme é mostrar como se forja um cidadão brasileiro autentico e comum. E o que esse "comum" pode fazer.

Certamente muito ainda se escreverá de Lula, muitos outros filmes serão feitos sobre sua vida e seu trabalho. Esse é apenas um deles. Mas abre as portas para mostrar histórias reais, autênticas e cheias de vida, sofrimento e realizações. A vida de um brasileiro. A vida de um brasileiro que, como muitos, não ficou sentado esperando "a vida passar". Um brasileiro que se posicionou perante sua história e de seus iguais e por conta disso chegou onde chegou.

Na última cena do filme uma frase gritada pelos metalúrgicos e que foi gritada por muitos dias em São Bernardo: "Se não soltar o Lula, ninguém vai trabalhar". Quem conhece a história sabe a força que ela representou naquele momento da história de nosso país.

Se você ainda tiver chance, assista o filme. Eu com certeza assistirei muitas vezes ainda...

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