Do Luis Nassif
Da Carta Maior
Um sucesso de vendas cercado por um muro de silêncio
Por Webster Franklin
Um sucesso de vendas cercado por um muro de silêncio
O livro "A Privataria Tucana", de Amaury Ribeiro Jr.,
foi lançado há quatro dias e já é um fenômeno de vendas cercado por um
muro de silêncio. Produto de doze anos de trabalho - e, sem dúvida, a
mais completa investigação jornalística feita sobre o submundo da
política neste século -, o livro consegue mapear o esquema de corrupção e
lavagem de dinheiro montado em torno do político tucano José Serra -
ex-deputado, ex-senador, ex-ministro, ex-governador, ex-prefeito e
candidato duas vezes derrotado à Presidência da República. De quebra,
coloca o PT em duas saias justas. A primeira delas é a constatação de
que o partido, no primeiro ano de governo Lula, "afinou" diante do
potencial de estrago da CPMI do Banestado, que pegou a lavanderia de
vários esquemas que, se atingiam os tucanos, poderiam também resvalar
para figuras petistas. O segundo mal-estar com o PT é o ultimo capítulo
do livro, quando o autor conta a "arapongagem" interna da campanha do
PT, que teria sido montada para derrubar o grupo ligado ao mineiro
Fernando Pimentel da campanha da candidata Dilma Rousseff. Amaury aponta
(como ele já disse antes) para o presidente do partido, Rui Falcão.
Falcão já moveu um processo contra o jornalista por conta disso. O
jornalista mantém a acusação.
Ao atirar para os dois lados, o livro-bomba do jornalista, um dos
melhores repórteres investigativos do país, acabou conseguindo a façanha
de ser ignorado pela mídia tradicional e igualmente pelo PT e pelo
PSDB. O conteúdo de seu trabalho, todavia, continua sendo reproduzido
fartamente por sites, blogs e redes sociais. Esgotado ontem nas
livrarias, caminha para sua segunda edição. E já foi editado em e-book.
Os personagens do PSDB são conhecidos. O ex-caixa de campanha de
Serra e de FHC, Ricardo Sérgio de Oliveira, aparece como o "engenheiro"
de um esquema que operou bilhões de dólares durante as privatizações e
os dois governos de Fernando Henrique Cardoso. A mesma tecnologia
financeira usada por Oliveira foi depois copiada pela filha de Serra,
Verônica, e seu marido, Alexandre Burgeois. Gregório Marin Preciado
surge também como membro atuante do esquema. Ele é casado com uma prima
do tucano nascido na Móoca, ex-líder estudantil e cardeal tucano.
Embora esteja concentrado nesse grupo específico do tucanato - o
empresário Daniel Dantas só aparece quando opera para o mesmo esquema -,
o livro não poupa gregos, nem troianos. A documentação da Comissão
Parlamentar de Inquérito Mista (CPMI) do Banestado, que forneceu os
primeiros documentos sobre lavagem de dinheiro obtido ilegalmente das
privatizações, é o pontapé inicial do novelo que se desenrola até as
eleições presidenciais do ano passado. A comissão, provocada por
denúncias feitas pela revista Isto É, em matéria assinada pelo próprio
Ribeiro Jr. e por Sônia Filgueiras, recebeu da promotoria de Nova York, e
foi obrigada a repassá-lo à Justiça de São Paulo, um CD com a
movimentação de dinheiro de brasileiros feita pelo MTB Bank, de NY,
fechado por comprovação de que lavava dinheiro do narcotráfico, do
terrorismo e da corrupção, por meio de contas de um condomínio de
doleiros sul-americanos.
O material era uma bomba, diz o jornalista, e provocou a "Operação
Abafa" da comissão de inquérito, pelo seu potencial de constranger tanto
tucanos, como petistas (a CPMI funcionou no primeiro ano do governo de
Luiz Inácio Lula da Silva, em 2003).
Amaury Ribeiro conta de forma simples intrincadas operações de
esfria/esquenta dinheiro ilegal - e, de quebra, dá uma clara ideia de
como operava a "arapongagem tucana" a mando de Serra. Até o livro, as
acusações de que Serra fazia dossiês para chantagear inimigos internos
(do PSDB) e externos eram só folclore. No livro, ganham nome, endereço e
telefone.
Nos próximo parágrafos, estão algumas das histórias contadas por
Amaury Ribeiro Jr., com as fontes. Nada do que aponta deixa de ter uma
comprovação documental, ou testemunhal. É um belo roteiro para a grande
imprensa que, se não acusou até agora o lançamento do livro, poderia ao
menos tomá-lo como exemplo para voltar a fazer jornalismo investigativo.
1. A arapongagem da turma do José Serra (pág. 25) -
Quando ministro da Saúde do governo FHC, José Serra montou um núcleo de
inteligência dentro da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa)
(a Gerência Geral da Secretaria de Segurança da Anvisa). O núcleo era
comandado pelo deputado Marcelo Itagiba (PSDB-RJ), também delegado. O
grupo foi extinto quando a imprensa denunciou que o grupo bisbilhotava a
vida dos funcionários. O funcionário da Agência Brasileira de
Informações Luiz Fernandes Barcellos (agente Jardim) fazia parte do
esquema. Também estava lá o delegado aposentado da Polícia Federal
Onézimo de Graças Souza.
Este núcleo, mesmo desmontado oficialmente, teria sido usado por
Serra, quando governador, para investigar os "discretos roteiros
sentimentais" do governador de Minas, Aécio Neves, no Rio de Janeiro. De
posse do dossiê, Serra teria tentado chantagear Aécio para que o
governador mineiro não disputasse com ele a legenda do PSDB para a
Presidência da República. O agente Jardim, segundo apurou Amaury, fez o
trabalho de campo contra Aécio. (Fontes: O agente da Cisa Idalísio
dos Santos, o Dadá, conseguiu informações sobre o núcleo de arapongagem
de Serra e teve a informação confirmada por outros agentes. Para a
"arapongagem" contra Aécio, o próprio Palácio da Liberdade).
2. O acordo entre Serra e Aécio (págs. 25 a 28) -
Por conta própria, Ribeiro Jr., ainda no "Estado de Minas" e sem que sua
apuração sobre a arapongagem de Serra tivesse sido publicada, retomou
pauta iniciada quando ainda trabalhava no "Globo", sobre as
privatizações feitas no governo FHC. Encontrou a primeira transação do
ex-tesoureiro de campanha de FHC e Serra, Ricardo Sérgio de Oliveira: a
empresa offshore Andover, com sede nas Ilhas Virgens Britânicas, que
injetava dinheiro de fora para outra empresa sua, em São Paulo, a
Westchester. (Fontes: cartórios de títulos e documentos e Juntas Comerciais de São Paulo e do Rio).
Nos mesmos papéis, encontrou outro personagem que usava a mesma
metodologia de Oliveira: o genro de Serra, Alexandre Bourgeois, casado
com Verônica Serra. Logo após as privatizações das teles, Bourgeois
abriu duas off-shores no mesmo paraíso fiscal - a Vex Capital e a
Iconexa Inc, que operavam no mesmo escritório utilizado pelo
ex-tesoureiro, o do Citco Building. (Fonte: 3° Cartório de Títulos e Documentos de São Paulo).
Amaury ligou para assessoria de Serra no governo do Estado e se deu
mal: as informações, das quais queria a versão do governador, serviram
para que o tucano paulista ligasse para Aécio e ambos aparassem as
arestas. O Estado de Minas não publicou o material.
3. Ricardo Sérgio de Oliveira, Carlos Jereissati e a privatização das teles -
O primeiro indício de que a privatização das teles encheu os cofres de
tucanos apareceu no relatório sobre as movimentações financeiras do
ex-caixa de campanha Ricardo Sérgio de Oliveira que transitou pela CPMI
do Banestado. A operação comprova que Oliveira recebeu propina do
empresário Carlos Jereissati, que adquiriu em leilão a Tele Norte Leste e
passou a operar a telefonia de 16 Estados. A offshore Infinity Trading
(de Jereissati) depositou US$ 410 mil em favor da Fanton Interprises (de
Ricardo Sérgio) no MTB Bank, de Nova York.
Comprovação do vínculo da Infinity Trading com Jereissati: Relatório
369 da Secretaria de Acompanhamento Econômico; documentos da CPMI do
Banestado.
Comprovação do vínculo de Oliveira com a Franton: declaração do
próprio Oliveira, à Receita Federal, de uma doação à Franton, em 2008.
4. Quando foi para a diretoria Internacional do
Banco do Brasil, Ricardo Sérgio tinha duas empresas, a Planefin e a RCM.
Passou a administração de ambas para a esposa, a desenhista Elizabeth,
para assumir o cargo público. Em 1998, a RCM juntou-se à Ricci
Engenharia (do seu sócio José Stefanes Ferreira Gringo), para construir
apartamentos. Duas torres foram compradas pela Previ (gerida pelo seu
amigo João Bosto Madeira da Costa) ainda na maquete. A Planefin entrou
no negócio de Intenet recebeu líquido, por apenas um serviço, R$ 1,8
milhão do grupo La Fonte, de Carlos Jereissati, aquele cujo consórcio, a
Telemar, comprou a Tele Norte Leste (com a ajuda de Ricardo Sérgio, que
forneceu aval do BB e dinheiro da Previ à Telemar).
5. Em julho de 1999, a Planefim comprou, por R$ 11 milhões, metade de
um prédio de 13 andares no Rio, e outra metade de outro edifício em
Belo Horizonte. As duas outras metades foram compradas pela Consultatum,
do seu sócio Ronaldo de Souza, que morreu no ano passado. Quem vendeu o
patrimônio foi a Petros, fundo de pensão dos funcionários da Petrobras,
reduto tucano. O dinheiro para pagar a metade de Ricardo Sérgio nos
imóveis veio da Citco Building, nas Ilhas Virgens Briânicas, a mesma
"conta-ônibus" de doleiros que viria a lavar dinheiro sul-americano
sujo, de várias procedências.
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