Do Sem Fronteiras
O prestígio do Poder Judiciário está em queda-livre. Cai mais do que as desconfianças nas finanças da Grécia, Itália e Espanha.
Os ministros Marco Aurélio Mello e a Associação Brasileira de
Magistrados (AMB) foram os grandes protagonistas de um descrédito jamais
sentido na história judiciária brasileira republicana.
A última bola fora diz respeito à representação proposta pela AMB e
tachada como criminosa pelo ministro Marco Aurélio, em entrevista ao
jornal O Estado de S.Paulo.
A representação foi encaminhada ao procurador-geral da
República, titular da ação penal pública em caso de crime, e ao Conselho
Nacional de Justiça (CNJ), órgão de controle sobre desvios funcionais
de magistrados não supremos: o Supremo Tribunal Federal já decidiu, em
causa própria, evidentemente, que o CNJ não tem poder correcional sobre
os 11 ministros do pretório excelso.
O motivo da “notícia de crime” contida na representação da AMB diz
respeito à atuação do Conselho de Controle de Atividades Financeiras
(Coaf).
O Coaf, a pedido do íntegro ministro Gilson Dipp, então corregedor do
CNJ, examinou a movimentação financeira de 217 mil funcionários
públicos judiciários, incluídos magistrados. Parêntese: juízes são
funcionários públicos em sentido amplo e são funcionários do Poder
Judiciário, em sentido estrito.
Das verificações, o Coaf apontou para 3.400 casos de movimentação
fora do padrão habitual. Em síntese, 3.400 servidores públicos que
podem, por exemplo, ter ganhado na loteria, recebido heranças, verba de
precatório desapropriatório ou vendido decisões, liminares ou de
mérito. O ministro Paulo Medina, ex-presidente da AMB, foi afastado das
funções, sem prejuízo de vencimentos e vantagens, por vender liminares.
No caso, não foi o Coaf mas o CNJ que apurou por conta própria.
O Coaf, e não sabe o ministro Marco Aurélio Mello nem o presidente da
AMB, tem, por força de lei, o chamado “dever de vigilância”. Não é um
órgão de investigação, mas de inteligência financeira. Ou seja, detecta e
informa a quem tem o dever de investigar.
O Coaf foi criado num esforço internacional para impedir a lavagem de
dinheiro e ocultação de capitais por organizações terroristas,
narcotraficantes e criminosos poderosos e potentes espalhados pelo
planeta.
Ao atender a uma requisição judiciária (o CNJ integra o Poder
Judiciário), o Coaf apontou uma movimentação fora do padrão, mas sem
afirmar tratar-se de consumação de crimes. Como frisado, o Coaf não
realiza investigações criminais.
Depois de conceder liminar em caso que não havia urgência e para
esvaziar a atuação do CNJ, isso no apagar das luzes do ano judiciário, o
ministro Marco Aurélio prestou um novo desserviço ao atribuir conduta
criminosa referente a quebra de sigilo de magistrados. Ele confunde
dever de vigilância com quebra de sigilo.
Fora isso, Marco Aurélio não quer deixar que o CNJ tome a iniciativa
de investigar juízes sob suspeita de desvio funcional, como, por
exemplo, venda de sentenças a traficantes de drogas etc. E o CNJ nasceu
para atuar correcionalmente.
Nessa quadro surreal de concessões de liminares sem o requisito
necessário da urgência, com o ministro Ricardo Lewandowsky impedindo a
continuação de correição no Tribunal de Justiça de São Paulo (em outros
estados foram realizadas sem ações e liminares), deve-se lembrar que, em
setembro passado, a inconstitucionalidade sobre a atividade
correcional do CNJ foi retirada da pauta de julgamento pelo plenário do
STF, sem oposição de Marco Aurélio Mello. Não saiu da pauta por não ser
considerada urgente.
Pano Rápido. O ministro Marco Aurélio seria um bom
candidato à presidência da Associação de Magistrados Brasileiros (AMB),
que congrega 16 mil juízes e tem no corporativismo e na manutenção de
privilégios (férias duas vezes ao ano) a sua bandeira de lutas.
Sobre interpretações, como levantou o jurista Joaquim Falcão, o
ministro Marco Aurélio foi vencido em 73% dos julgamentos sobre questões
de Direito Constitucional no STF (confira-se: Folha de S.Paulo, edição de 20 de dezembro, pág A6).
A respeito da decisão de Marco Aurélio de soltura do banqueiro
golpista Salvatore Cacciola, frise-se, se deu por liminar e
contrariando decisões de juiz federal, do Tribunal Regional Federal e do
Superior Tribuanl de Justiça.
Wálter Fanganiello Maierovitch
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