Os movimentos que se intensificam nos EUA contra o atual momento por que passa o país onde novamente a tentativa de salvar os grandes conglomerados parece ser a tônica das decisões, começa a produzir análises sobre o futuro. Vou aqui tentar mostrar algumas delas sempre que surgirem.
Por Assis Ribeiro
Do Viomundo
Wall Street: Rompendo 30 anos de controle sobre a imaginação humana
Occupy Wall Street redescobre a imaginação radical
Os jovens que protestam em Wall Street e além rejeitam esta ordem econômica vã. Eles vieram para resgatar o futuro
Por que as pessoas estão ocupando Wall Street? Por que a ocupação —
apesar da mais recente repressão policial — espalhou fagulhas através
dos Estados Unidos, inspirando em alguns dias centenas de pessoas a
mandar pizzas, dinheiro, equipamento e, agora, a começar seus próprios
movimentos chamados OccupyChicago, OccupyFlorida, Occupy Denver ou
Occupy LA?
Existem razões óbvias. Estamos vendo o começo de
uma desafiadora auto-afirmação de uma nova geração de norte-americanos,
uma geração que está vendo um futuro de educação sem emprego, sem
futuro, mas sob o peso de uma dívida enorme e sem perdão. A maioria,
descobri, é da classe trabalhadora ou de origem modesta, meninos e
meninas que fizeram tudo o que foi recomendado a eles: estudaram,
entraram na faculdade, e agora não apenas estão sendo punidos, mas
humilhados — diante da perspectiva de serem tratados como zeros à
esquerda, moralmente reprovados.
É realmente surpreendente que eles gostariam de trocar uma palavra com os magnatas financeiros que roubaram seu futuro?
Assim como na Europa, estamos vendo o resultado colossal de um
fracasso. Os ocupantes são pessoas cheias de ideias, cujas energias uma
sociedade saudável deveria aproveitar para melhorar a vida de todos.
Em vez disso, elas estão usando a energia em busca de ideias para
derrubar todo o sistema.
Mas o fracasso maior aqui é da imaginação. O que estamos
testemunhando pode ser também uma demanda para finalmente ter um debate
que todos nós supostamente deveríamos ter tido em 2008. Aquele era um
momento, depois do quase-colapso da arquitetura financeira do mundo,
em que qualquer coisa parecia possível.
Tudo o que havia sido dito a nós nas décadas anteriores provou-se
mentira. Os mercados não eram auto-reguláveis; os criadores de
instrumentos financeiros não eram gênios infalíveis; e as dívidas não
tinham de ser verdadeiramente pagas — na verdade, o dinheiro em si
mostrou-se um instrumento político, trilhões de dólares podendo ser
inventados durante a noite quando os bancos centrais ou governos assim
quisessem. Mesmo a [revista britânica] Economist deu manchetes como
“Capitalismo: Foi uma boa ideia?”.
Parecia o tempo para repensar tudo: a própria natureza dos mercados,
do dinheiro, da dívida; de se perguntar para que serve uma ‘economia’.
Isso durou talvez duas semanas. Então, numa das mais colossais faltas
de coragem histórica, nós todos, coletivamente, colocamos nossas mãos
sobre as orelhas e tratamos de tentar colocar as coisas o mais
próximas do que tinham sido antes.
Talvez não seja surpreendente. Está se tornando crescentemente óbvio
que a verdadeira prioridade daqueles que dirigiram o mundo nas últimas
décadas não era criar uma forma viável de capitalismo, mas, em vez
disso, nos convencer de que a atual forma de capitalismo é a única forma
possível de sistema econômico, e que seus defeitos, portanto, são
irrelevantes. Desta forma, todos assistimos sentados enquanto o aparato
desaba.
O que aprendemos agora é que a crise econômica dos anos 70 na verdade
nunca acabou. Foi superada com crédito barato e pilhagem maciça no
Exterior — esta última, de nome “crise da dívida do Terceiro Mundo”. Mas
o sul global lutou de volta. O movimento de ‘alter-globalização’ foi,
no fim das contas, bem sucedido: o Fundo Monetário Internacional foi
expulso do Leste da Ásia e da América Latina, assim como agora está
sendo expulso do Oriente Médio. Como resultado, a crise da dívida chegou
à Europa e à América do Norte, repleta do mesmo tipo de solução:
declare uma crise financeira, indique tecnocratas supostamente neutros
para gerenciá-la e em seguida se engaje numa orgia de pilhagem em nome
da ‘austeridade’.
A forma de resistência que emergiu parece marcadamente similar ao
velho movimento de justiça global, também: vemos a rejeição da antiga
política partidária, a adoção da mesma diversidade radical, a mesma
ênfase em inventar novas formas de democracia de baixo para cima. O que é
diferente é o alvo: se em 2000 os protestos eram dirigidos ao poder
das novas burocracias planetárias sem precedentes (Organização Mundial
do Comércio, FMI, Banco Mundial, Nafta), instituições que não
prestavam contas democraticamente, que existem apenas para servir aos
interesses do capital transnacional; agora, é contra toda a classe
política de países como a Grécia, a Espanha e agora, os Estados Unidos
— exatamente pelas mesmas razões. É por isso que os manifestantes tem
hesitado em fazer demandas formais, já que isso significa o
reconhecimento implícito dos políticos contra os quais eles se
revoltam.
Quando a história for finalmente escrita, no entanto, é provável que
todo este tumulto — começando com a Primavera árabe — será lembrado
como o tiro de largada de uma onda de negociações sobre a dissolução do
Império Norte-Americano. Trinta anos de insistente prioridade na
propaganda sobre a substância, do solapamento de qualquer coisa que
pudesse parecer base política de uma oposição, pode fazer parecer aos
jovens manifestantes que suas perspectivas são sombrias; e está claro
que os ricos estão determinados a garantir uma fatia tão grande quanto
possível das sobras, jogando uma geração inteira de jovens aos lobos
para garantir isso; mas a História não está do lado deles.
Talvez seja bom a gente considerar as consequências do colapso dos
impérios coloniais europeus. Não levou ao sucesso dos ricos em agarrar
toda a comida disponível, mas à criação do estado de bem-estar social.
Não sabemos exatamente o que vai acontecer agora. Mas se os ocupantes
finalmente conseguirem romper o controle exercido durante 30 anos
sobre a imaginação humana, como aconteceu nas primeiras semanas depois
de setembro de 2008, tudo vai novamente estar em jogo — e os
manifestantes de Wall Street e de outras cidades dos Estados Unidos
terão feito por nós o maior dos favores.
PS do Viomundo: O movimento já atingiu 1015 cidades dos Estados Unidos.
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