Guarani-kaiowá comete suicídio e MS se nega a prestar atendimento
MPF/MS: Estado se recusa a prestar atendimento emergencial nas aldeias de MS
via e-mail
Negativa da Polícia Civil em registrar ocorrência de suicídio no
último final de semana ilustra descaso do governo estadual com população
indígena
Mais um jovem guarani-kaiowá cometeu suicídio em Mato Grosso do Sul.
Agripino da Silva, de 23 anos, foi encontrado morto na madrugada do
último sábado (27) no acampamento Ypo’i, localizado no interior da
Fazenda São Luiz, em Paranhos/MS.
A Polícia Civil, ao ser acionada, se recusou a comparecer ao local
para realizar perícia e registrar Boletim de Ocorrência (BO), sob o
argumento de se tratar de área em litígio. O corpo foi retirado do
acampamento por uma funerária – após requisição enviada por e-mail pela
Delegacia da Polícia Civil de Paranhos – e encaminhado ao Instituto
Médico Legal de Ponta Porã para exame pericial.
O caso, além ilustrar os recorrentes suicídios nas comunidades
indígenas do cone sul de MS, também elucida a falta de apoio policial e
de segurança pública nas aldeias do estado, especialmente quando se
trata de atendimento emergencial (190).
Para reverter essa situação e assegurar o direito constitucional à
segurança, o Ministério Público Federal (MPF) ajuizou uma ação civil
pública contra o Estado de Mato Grosso do Sul. A ação busca mudar o
entendimento da Procuradoria-Geral do Estado que, em ofícios
encaminhados às Polícias Civil e Militar, determina que os órgãos
policiais não realizem atendimento às comunidades indígenas, seja ele
emergencial ou preventivo, com a alegação de se tratar de competência
exclusiva da Polícia Federal.
No entendimento do MPF, “o fato da Terra Indígena ser bem da União
não torna os índios propriedade ou interesse desta, sujeitos, portanto, à
competência federal”. A tese do MPF é reforçada na prática: delitos em
detrimento da vida, patrimônio, honra e integridade praticados pelos
índios são julgados pela Justiça Estadual e não Federal.
“O fato de serem índios não lhes atribui qualquer diferenciação na
hora de serem julgados, desse modo, o atendimento emergencial aos
indígenas não deve ser tido como uma exceção à regra, mas, também para
eles, deve incidir a mesma regra que recai sobre os demais cidadãos”,
destaca a ação.
Ausência
Na última quarta-feira (24), foi realizada na Justiça Federal de
Dourados, audiência de conciliação para tentar solucionar a falta de
atendimento emergencial nas aldeias. Estavam presentes representantes do
MPF, Advocacia Geral da União, Procuradoria da União, Funai,
Superintendência da Polícia Federal e lideranças indígenas. O governo do
Estado, também convocado pra audiência, não compareceu.
Apesar da negativa em tratar do assunto, os índices de violência
entre os guarani-kaiowá continuam elevados. Entre 2010 e setembro de
2012 foram registrados, apenas na Reserva Indígena de Dourados, 71
homicídios.
“É interessante observar que os indígenas são ignorados no
atendimento policial, mas inclusos nas estatísticas do governo quando da
solicitação de verbas federais para policiamento na fronteira. A
fiscalização fronteiriça é expressamente privativa da União, mas
curiosamente, neste caso, o Estado nunca alegou incompetência para
realizar”, destaca o procurador da República Marco Antonio Delfino de
Almeida.
Bloqueio de verbas
Diante do tratamento desigual, o Ministério Público Federal (MPF) em
Dourados também ajuizou ação para garantir policiamento preventivo nas
aldeias, em especial na Reserva Indígena de Dourados. O MPF pede à
Justiça o bloqueio de verbas federais destinadas ao governo do Estado
até a execução do Plano de Policiamento Comunitário nas Aldeias.
O plano foi definido em agosto deste ano, após assinatura de Acordo
de Cooperação Técnica entre a União e o Estado de Mato Grosso do Sul –
realizada em março de 2012. O projeto, entretanto, sequer começou a ser
implantado, pois, segundo o governo do Estado, seriam necessários quase
R$ 3 milhões de reais – de verbas exclusivamente federais – para sua
execução.
Incluídos nos dados, excluídos dos benefícios
Em paralelo ao Plano de Policiamento, investigação do MPF identificou
convênio entre a União e o Estado de MS no montante de R$ 20 milhões.
Os recursos seriam utilizados no controle e fiscalização das fronteiras e
o valor do repasse foi definido com base em índices de violência e de
habitantes a serem alcançados pelo convênio.
Na região sul de Mato Grosso do Sul, área de fronteira com o
Paraguai, são mais de 44 mil índios guarani-kaiowá que sofrem com um dos
mais elevados números de homicídios e de suicídios do país. No
entendimento do MPF, parte deste montante deveria ser destinado à
segurança nas aldeias – que integram a região fronteiriça e,
reconhecidamente, possuem alto índice de violência.
“O Estado, sabendo de suas reais necessidades em proteger a população
indígena, condiciona a prestação de serviços de segurança pública a
esses povos ao repasse de quase R$ 3 milhões pela União quando, por
outro lado, e argumentando beneficiar diretamente toda a população
fronteiriça, recebe quase R$ 21 milhões em repasses de verbas federais
para alcançar os mesmos objetivos”, destaca o MPF.
Na ação, o Ministério Público Federal pede o bloqueio de 3 dos 20
milhões de reais transferidos pela União ao Estado. O valor corresponde à
verba necessária para a implantação da Polícia Comunitária nas aldeias.
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