O resultado obtido pelo Partido dos Trabalhadores nas eleições
municipais deste domingo serviu para enfraquecer duas teses políticas
que começavam a ganhar corpo entre analistas, partidos e políticos
brasileiros. A primeira é de que a influência do ex-presidente Luiz
Inácio Lula da Silva em eleições municipais estava cada vez mais
restrita a cidades largamente beneficiadas por programas sociais do
governo federal, como o Bolsa Família. A segunda é de que o julgamento
do mensalão no Supremo Tribunal Federal (STF) teria força suficiente
para impactar candidatos dos partidos envolvidos, em especial o PT.
O PT de Lula garantiu a arrancada de Fernando Haddad na
última semana da campanha pela Prefeitura de São Paulo. O candidato
petista, que recebeu apenas cerca de 100 mil votos a menos que o
vencedor do primeiro turno, José Serra (PSDB), foi uma criação exclusiva
de Lula. Assim como a presidenta Dilma Rousseff, ungida candidata à
Presidência da República pelo antecessor, Haddad nunca havia sido
candidato a nada. Nem a presidente de partido.
Ministro da Educação de Lula em seu primeiro e segundo
mandatos, Haddad foi imposto como candidato à Prefeitura de São Paulo ao
PT pelo ex-presidente no ano passado. Desconhecido, rejeitado por
grupos importantes do partido em São Paulo, como aquele liderado pela
agora ministra da Cultura e ex-prefeita de São Paulo, Marta Suplicy, no
início da campanha, Haddad era chamado de Andrade pelos eleitores da
periferia de São Paulo. Largou com 3% de intenções de voto nas primeiras
pesquisas e só ultrapassou a casa dos 10% após o início do programa
eleitoral gratuito.
Mas Lula repetiu a estratégia que adotou com Dilma e
apostou todas as suas fichas em sua popularidade como ex-presidente. Ao
longo de toda a campanha, Haddad apresentou-se, basicamente, como o
candidato de Lula. E Lula, mesmo recuperando-se de um câncer na laringe,
não poupou esforços para fazer sua aposta vingar. Esteve em dezenas de
comícios, gravou inúmeros programas de TV e de rádio e, muitas vezes,
foi pessoalmente fazer campanha com seu escolhido pelas ruas de São
Paulo.
Ao final do périplo, Haddad conquistou a vaga, apertada, é
verdade, ao segundo turno. A vitória do petista foi a vitória de Lula
porque sem Lula não haveria Haddad.
Mas a força do ex-presidente não se mostrou infalível. Na
verdade, Lula sofreu duas derrotas importantes, ambas para o ainda
aliado PSB, liderado pelo governador de Pernambuco e potencial candidato
à Presidência da República, Eduardo Campos.
No Recife, o ex-ministro da Saúde de Lula
Humberto Costa foi massacrado pelo candidato de Eduardo Campos, Geraldo
Júlio. E, em Belo Horizonte, o também ex-ministro Patrus Ananias não
conseguiu, mesmo com o apoio de Lula e Dilma, fazer frente ao prefeito
Márcio Lacerda.
A aposta de que o julgamento do mensalão, que
entrou em sua fase mais crítica para o PT às vésperas da eleição, iria
abater muitas candidaturas petistas também se mostrou incorreta. O
Partido dos Trabalhadores conseguiu eleger um prefeito em primeiro turno
– em Goiânia – e colocou outros seis candidatos no segundo turno. Além
das politicamente periféricas Cuiabá, João Pessoa e Rio Branco, ainda
vai disputar capitais importantes, como São Paulo, Fortaleza e Salvador.
Além disso, mostrou força em cidades onde o mensalão
atingiu em cheio políticos locais. O caso mais emblemático é o de
Osasco, na Grande São Paulo. No início da campanha, o candidato do
partido era o ex-deputado João Paulo Cunha, que acabou sendo condenado
pelo STF e, com isso, abandonou a disputa. Em seu lugar assumiu Jorge
Lapas, que era candidato a vice na chapa original. A mudança mostrou-se
inócua para a oposição. Lapas foi eleito no primeiro turno, com mais de
60% dos votos válidos.
Em Campinas, onde um prefeito apoiado pelo PT, Dr. Hélio,
foi cassado na última legislatura e seu sucessor, esse do PT, Demétrio
Vilagra, também perdeu o cargo um ano depois, o partido conquistou uma
importante vitória. Lá o ex-presidente do Ipea, Márcio Pochmann, também
um estreante em disputas eleitorais, conquistou uma improvável vaga no
segundo turno.
A análise é de que o julgamento é complexo demais para
impactar uma eleição regional demais, como a municipal, onde estão em
jogo questões muito pragmáticas. Os principais dirigentes do PT adotaram
a tática de fazer pouco caso do mensalão.
Entre ministros de Dilma, o tom era semelhante. "O
eleitor está sabendo discernir muito bem as coisas", disse o ministro da
Justiça, José Eduardo Cardozo. "Este tipo de campanha não tem dado
certo em lugar nenhum", emendou o presidente do PT, Rui Falcão. E o
próprio Lula endossou: "O povo não está preocupado com isso agora. O
povo está preocupado se o Palmeiras vai cair, se o Fernando Haddad vai
ser eleito”, disse Lula, em seu tradicional tom de chiste, pouco antes
das aberturas das urnas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário