Para ministro da Saúde, atendimento básico em horários
alternativos, espaços públicos para atividades físicas e prevenção
contra as drogas são os principais desafios para o setor
São Paulo – Porta de entrada para o sistema público, as Unidades
Básicas de Saúde (UBS) devem funcionar em horários alternativos,
preferencialmente 24 horas por dia. Isso para permitir o acesso de
trabalhadores, em especial os que vivem e trabalham nos grandes centros
urbanos, que chegam a levar até três horas para ir ao trabalho e outras
três na volta para casa, além de estudantes, que devem passar mais tempo
na escola. É o que defendeu o ministro da Saúde Alexandre Padilha em
palestra durante o seminário Governança Metropolitana – desafios, tendências e perspectivas,
que o Instituto Lula e a Fundação Perseu Abramo realizaram semana
passada em São Paulo. A afirmação é publicada em virtude do Dia Mundial
da Saúde, celebrado neste 7 de abril.
“Os serviços, que não podem se limitar a um modelo único, têm que
estar mais perto de onde as pessoas vivem e trabalham e funcionar em
horários alternativos, em até três turnos”, disse Padilha. “Uma rede com
UBS e estratégias de saúde da família que funcionam entre as 8 e 18
horas não dá conta do cidadão que leva três horas para ir e três horas
para voltar do trabalho; não dá conta de quem chega em casa às 8 da
noite, 9 horas, quando o posto de saúde está fechado. É necessário
também atendimento em locais onde é mais fácil para o cidadão chegar.”
Segundo Padilha, também é fundamental a aproximação da saúde com o
mundo do trabalho e com a escola. Para isso, defende o fortalecimento de
programas de saúde do trabalhador com redes permanentes e abertas, que o
acolham na hora que ele quiser ou precisar.
População acima do peso
Outro grande desafio, conforme o ministro, são temas contemporâneos
de maior intensidade sobretudo nas regiões metropolitanas. No ano
passado, o ministério fez uma pesquisa nas capitais e constatou que
metade da população está acima do peso; que dela 15% é obesa; que entre a
população com menos de oito anos de escolaridade só 15% faz atividade
física regular. E que entre quem estudou por mais de oito anos, o número
sobe para 30%.
“Em outras palavras, ter espaço para atividade física é algo
exclusivo para quem tem acesso a academias privadas, aos clubes. Espaços
públicos bonitos e conservados estão nas regiões mais centrais das
cidades”, disse. É por isso, segundo ele, que as academias de saúde que
serão construídas em parceria com as prefeituras até 2014 são
fundamentais para que, entre outras coisas, a nova classe média não seja
obesa daqui a 10, 20 anos, não trazendo consequências negativas à
qualidade da saúde e nem aos serviços públicos.
Acidentes e drogas
Um terceiro desafio é a prevenção de acidentes de carro e de moto.
Conforme Padilha, num pronto-socorro, numa UTI de referência, 30% a 40%
dos casos é de vítimas de acidentes. Em 2010, cerca de 40 mil pessoas
morreram por essas causas. Foram 46 mil internações no Sistema Único de
Saúde. Naquele ano, só no atendimento inicial foram gastos R$ 200
milhões.
“Isso sem contar o que vem depois, como reabilitação física e outros
problemas decorrentes. Nenhum gestor de saúde pública aguenta prover
serviços de urgência e emergência. Temos que investir fortemente na
prevenção”, disse. “É insustentável do ponto de vista do financiamento
porque é no sistema público que todas essas pessoas são atendidas, mesmo
que tenham plano de saúde.” O Serviço de Atendimento Móvel de Urgência
(Samu), lembrou, é do SUS, assim como o pronto-socorro de trauma.
“Nenhuma vítima de acidente, nem as mais ricas, são atendidas no
Sírio-Libanês, Albert Einstein”.
Outra questão apontada é a das drogas, entre elas o crack. Presença
cada vez maior nas cidades grandes, médias ou pequenas, exige
reorganização dos serviços de saúde para atender em especial as
populações de rua. “Uma medida criada pelo ministério é o consultório na
rua, que já existe em cidades como Diadema”, informou. Uma equipe de
saúde funciona em horário alternativo, até meia noite, 1 hora, 2, 3
horas da madrugada para cuidar das pessoas que vivem na rua. Já foram
formadas 80 dessas equipes. Até 2014 serão 310.
Padilha acredita que o decreto 7.508, de junho de 2011, vai estimular
algumas iniciativas importantes. Isso porque regulamenta a lei 8.080,
de 1990, que fixa regras para a organização do Sistema Único de Saúde, o
planejamento do setor, a assistência e articulação entre União, estados
e municípios. Entre as inovações da lei está a criação das regiões de
saúde, que, além de somar equipamentos e serviços ambulatoriais, vai
ajudar a fixar profissionais, uma vez que deixará de existir uma “guerra
entre os prefeitos”, na qual perde o município mais pobre, que não pode
contratar médicos com salários maiores.
Um dos principais problemas – talvez o maior – para a expansão e a
qualidade do serviço de saúde é o financiamento. Para se ter uma ideia, o
atual gasto per capita na saúde privada é três vezes maior do que se
gasta no serviço público. Além disso, o sistema tem custo altíssimo com a
cobertura de procedimentos de alta complexidade, como transplantes, por
exemplo, que beneficiam inclusive pacientes que têm planos de saúde.
Médicos para o SUS
A formação de profissionais é outra contradição na estruturação do
SUS nos últimos 20 anos, conforme o ministro, que é médico
infectologista formado pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
“Em todos os países que tiveram sistemas nacionais públicos, o gestor
nacional do sistema determina, estabelece e dirige as diretrizes para a
formação profissional. No nosso país, ao longo de todos esses anos, não
foram as necessidades do SUS que determinaram a abertura de faculdades
de medicina ou as vagas por especialidade nas residências”.
Segundo Padilha, essa mudança está em curso. Tanto que a presidenta
Dilma iniciou a aproximação e maior diálogo entre os ministérios da
Saúde e da Educação para que o processo de formação de profissionais se
dirija às reais necessidades do setor. E foi criada uma regra para o
FIES (fundo de financiamento estudantil), segundo a qual o médico que
trabalhar para o SUS não precisará reembolsar o fundo.
O ministro apontou ainda que o município de Guarulhos, com 1,3 milhão
de habitantes, não tem nenhuma faculdade de medicina. O mesmo ocorre
com a Baixada Fluminense. Já a região do ABC paulista, com 3 milhões de
habitantes, tem uma faculdade apenas, assim como a região metropolitana
de Salvador. “O Brasil é o único país no mundo com mais de 100 milhões
de habitantes que assumiu o desafio de prover saúde gratuita para todos.
Para atender esse desafio, é preciso inundar as faculdades com alunos
da periferia e da classe C”, disse. “Nós vamos estimular a criação de
faculdades de medicina nas regiões metropolitanas. Diadema, sozinha, não
cria. Mas junto com São Bernardo, sim”.
Conforme ele, o marco legal que regulamenta o SUS, estimulando a
organização da saúde nas regiões metropolitanas e em polos nas cidades
do interior, é uma conquista porque nenhum município sozinho, nem mesmo
São Paulo, consegue prover o acesso à saúde de seus habitantes. Ele se
diz otimista porque “vivemos agora uma oportunidade única [com maior
diálogo entre governo federal, estados e municípios] para lidar com
questões como essas. Precisamos assumir essa responsabilidade”.
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