Do Sem Fronteiras
Desde os anos 90, a cidade convive com a Cracolândia e os governos
são incapazes de adotar políticas adequadas. Nem as delegacias
especializadas, tipo Denarc (delegacia de narcóticos), nem a polícia
militar identificaram, até hoje, a origem do crack que é ofertado.
Agora, numa ação policialesca, busca-se o cerco ao usuário para se
chegar ao vendedor da droga. Vendedor que, evidentemente, não é o
operador da rede de abastecimento de crack para as cracolândias
brasileiras.
É inacreditável. Em tempos de Tribunal Penal Internacional e de luta
sem fronteiras por respeito aos direitos humanos e contra a tortura, o
prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, e o governador do estado
paulista, Geraldo Alckmin, adotam, na conhecida Cracolândia, violência
contra dependentes de crack. A dupla de governantes acaba de oficializar
a tortura.
Na quarta-feira (4), por determinação do prefeito da cidade de São
Paulo e do governador do Estado, iniciou-se o denominado “Plano de Ação
Integrada Centro Legal”. Esse plano, consoante anunciado, terá duração
indeterminada.
O plano, como explicou o coordenador de políticas de drogas da
Secretaria Estadual de Justiça e Cidadania, Luiz Alberto Chaves de
Oliveira, consiste em obrigar os dependentes que vivem na Cracolândia a
buscar ajuda, “pela dor e sofrimento” decorrentes da abstinência, junto
às autoridades sanitárias ou redes de saúde.
Ao tempo do DOI-CODI, a tortura, como regra mestra, foi largamente
empregada. A regra era torturar, física ou psicologicamente, para obter o
resultado esperado.
Nos campos nazistas, a fome e o abandono levavam à morte. Auxiliavam
na vazão, pois, eram insuficientes em número os fornos crematórios.
A tortura indireta posta em prática pela dupla Kassab-Alckmin tem o
mesmo fundamento dos campos de concentração nazista. E a tortura
imperava no DOI-CODI, de triste memória.
Em nenhum país civilizado emprega-se essa estratégia desumana a
dependentes. Ao contrário, investe-se no convencimento ao tratamento e
até nas salas seguras para uso de drogas.
As federações do comércio e da indústria da Alemanha apoiam os
programas de narcossalas com 1 milhão de euros. E ninguém esquece a
lição do professor Uwe Kemmesies, da Universidade de Frankfurt: “Podemos
reconhecer que a oferta de salas seguras para o consumo de drogas
melhorou a expectativa e a qualidade de vida de muitos toxicodependentes
que não desejam ou não conseguem abandonar as substâncias”:
Uma questão sócio-sanitária, de saúde pública, não pode mais ser
enfrentada com soluções torturantes, como pretendem Alckmin-Kassab.
Pano Rápido. Aguarda-se que a ministra responsável
pela Secretaria Nacional de Direitos Humanos, Maria do Rosário, tome
medidas adequadas para suspender as torturas em São Paulo e o
procurador-geral da República, Roberto Gurgel, inicie apurações
criminais. E espera-se que a nova procuradora junto ao Tribunal Penal
Internacional, Fatou Bensouda, natural de Gâmbia (África Ocidental),
levante o que acontece na Cracolândia e enquadre as irresponsabilidades e
desumanidades.
Wálter Fanganiello Maierovitch
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