A denúncia do jornalista Leandro Fortes, da revista Carta Capital, acerca da ação do funcionário do Tribunal Superior do Trabalho Renato Parente,
levará o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) a uma averiguação quanto ao
repasse de recursos da Fundação Renato Azeredo, com sede em Belo
Horizonte. Segundo fonte ouvida pelo Correio do Brasil,
na condição de anonimato, o Conselho pedirá informações ao Ministério
Público de Minas Gerais sobre as transferências do Poder Judiciário à
fundação presidida por um ex-assessor especial do então governador Aécio
Neves, no valor de R$ 23,3 milhões.
Segundo apurou o jornalista, “Renato Parente é um assessor
especialmente influente nos tribunais superiores. Foi fiel escudeiro de
Gilmar Mendes no Supremo Tribunal Federal (STF) e até pouco tempo
ocupava a chefia da comunicação do Tribunal Superior do Trabalho,
presidido por João Oreste Dalazen. Por uma questão formal, Dalazen
rebaixou Parente de função, mas manteve seus poderes, que consistem
basicamente em administrar as verbas do setor no TST, naco de um filão
milionário do Poder Judiciário onde reina a Fundação Renato Azeredo, de
Minas Gerais. Trata-se de um eficiente sorvedouro de dinheiro público
comandado pelo PSDB”.
Ainda segundo o texto, o objetivo inicial da Fundação Renato Azeredo,
criada em 1996 com o nome do pai do senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG),
era o de auxiliar projetos de pesquisa da Universidade Estadual de Minas
Gerais (UEMG). A instituição, de direito privado e sem fins lucrativos,
a partir de 2003, bateu recordes de faturamento.
“Apenas em Minas Gerais, entre 2003 e 2011, a Fundação Renato Azeredo
faturou R$ 212,1 milhões de verbas repassadas diretamente do governo de
Minas, graças a contratos firmados em gestões tucanas, duas de Aécio
Neves e, desde o ano passado, a de Antonio Anastasia. A fundação é
presidida pelo farmacêutico Aluísio Pimenta, ex-assessor especial de
Aécio. Sob pretexto de notória especialização, a fundação sempre foi
contratada pelos governos tucanos sem licitação. Na primeira gestão de
Neves, por exemplo, a entidade recebeu cerca de R$ 20 milhões, limpos,
dos cofres estaduais, para serviços em área de comunicação social”,
apurou Leandro Fortes.
A tevê estatal mineira, a Rede Minas, repassou à Fundação
Renato Azeredo, por transferência direta, R$ 17,6 milhões, também em
quatro anos. Os dados que serão pedidos por setores do CNJ ao governo
mineiro estão contidos na investigação ainda em curso no Ministério
Público Estadual, que detectou, em 2008, uma transferência de R$ 23,3
milhões. “Mas nada comparado ao ano eleitoral de 2010, quando a Renato
Azeredo levou uma bolada de R$ 51,7 milhões, R$ 35,9 milhões dos quais
apenas no primeiro semestre, às vésperas das eleições. Os promotores
suspeitam que a fundação possa ter substituído o esquema de caixa 2
montado por Eduardo Azeredo com o publicitário Marcos Valério de Souza,
mais tarde importado pelo PT e revelado no chamado ‘escândalo do
mensalão”, acrescenta Fortes.
“Ao contrário dos promotores mineiros, os procuradores da República
em Brasília ainda não atinaram para o mesmo esquema montado no Poder
Judiciário Federal, com verbas da União. Desde 2010, a Fundação Renato
Azeredo passou a substituir outro baluarte do tucanato, a Fundação Padre
Anchieta, responsável pela TV Cultura, de São Paulo, até então
dona das contas de comunicação social do Supremo Tribunal Federal
(STF), Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Conselho Nacional de Justiça
(CNJ) e Superior Tribunal de Justiça (STJ). Sem aviso e sem
justificativa, naquele ano eleitoral, a fundação do tucano paulista
decidiu abandonar os tribunais e abrir espaço para a coirmã mineira, num
esquema de revezamento pouco sutil”, relata o jornalista.
Fratura exposta
No STJ, de acordo com a matéria, “a Fundação Renato Azeredo ganhou,
sem licitação, em 2010, um contrato de R$ 10,5 milhões por ano (depois
reduzido para R$ 6,6 milhões). Foi beneficiada por decisão do
ex-presidente do tribunal César Asfor Rocha, amigo dileto do ministro
Gilmar Mendes, do STF, fundamental para garantir a presença de Renato
Parente na história”.
– Renato Parente é a fratura exposta de um sistema que usa, no Poder
Judiciário, as áreas de comunicação social para arrecadar fortunas em
contratos fajutos e mal fiscalizados. Por 20 anos, ele fraudou esse
mesmo sistema, com um currículo falso, mas se mantém prestigiado por
conta de um apadrinhamento político, no mínimo, estranho: Gilmar Mendes e
Marco Aurélio Mello – afirmou Fortes.
Procurado no TST, Parente não foi encontrado em seu local de
trabalho, mas coube ao coordenador da assessoria de imprensa, Alexandre
Machado, confirmar que ele é funcionário da repartição e estaria movendo
um processo contra o jornalista de Carta Capital. A questão,
porém, era pessoal e Machado, que somente poderia falar em nome do
Tribunal, não teria dados sobre a ação. O Tribunal, no entanto, não
movia até aquele momento nenhuma ação contra Fortes, segundo o assessor.
Em uma rede social, Fortes reforça que Parente seria “um afilhado
funcional do ministro Gilmar Mendes, do STF, que passou os últimos 20
anos ocupando ilegalmente cargos comissionados no Poder Judiciário de
posse de um currículo falso, no qual afirmava possuir um diploma de
curso superior que nunca teve. Pego pela burocracia do TST, onde foi
flagrado defendendo interesses de uma fundação tucana, Renato Parente já
tem uma estratégia de defesa para tentar se safar: me processar! Por
que será que não estou surpreso?”, escreve o jornalista.
No próprio CNJ, que agora passa a investigar as denúncias contra
Parente, “a Fundação Renato Azeredo foi contratada também sem licitação,
em 8 de março de 2010, durante a gestão de Gilmar Mendes, por um prazo
de seis meses”, revela o jornalista. O valor desse primeiro contrato
teria sido de R$ 1,6 milhão. Em 22 de setembro de 2010, o contrato fora
renovado automaticamente por um ano, pelo valor de R$ 4,2 milhões,
“situação que se mantém até agora”, afirma a matéria.
No Supremo, com a saída da Fundação Padre Anchieta, assim que assumiu
o lugar do presidente Gilmar Mendes, Cezar Peluso teria promovido uma
licitação, vencida pela Fundação Legião da Boa Vontade (LBV), de
Brasília, em julho de 2010. Esta, porém, fora desqualificada “por não
conseguir preencher os requisitos técnicos para a produção de
noticiários para a TV e a Rádio Justiça, mantidas pelo Supremo.
Classificada em segundo lugar, a Fundação Renato Azeredo levou o
contrato de R$ 15 milhões”, relata Fortes.
“No TSE, a fundação mineira também venceu a concorrência e abocanhou
dois contratos. Um, de junho de 2010 a junho de 2011, de R$ 4,2 milhões.
Outro, a vencer em junho próximo, de R$ 3,1 milhões. A diferença de R$
1,1 milhão é parte de uma regra do Tribunal que garante valores maiores
para contratos firmados em anos eleitorais”, apurou.
Parente surgiu como elo nos processos milionários apenas no ano
passado, “quando a burocracia interna do TST descobriu que, desde 1992,
ele ocupa cargos comissionados de nível superior dentro do Poder
Judiciário sem nunca ter-se formado em nada, apesar de se apresentar
como jornalista e publicitário”, escreveu o repórter. “Mesmo sem
diploma, ele disponibilizou currículos fraudulentos nos quais constava a
seguinte informação: Graduado pela Escola Superior de Propaganda e
Marketing (ESPM)’, de São Paulo. Há seis meses, uma ligação do TST para a
direção da famosa escola paulista bastou para desmontar a farsa”,
acrescenta.
“Técnico judiciário de nível médio do Tribunal Regional do Trabalho
(TRT) de São Paulo, Parente foi assessor de imprensa do juiz Nicolau dos
Santos Neto, o Lalau, responsável por desvio de dinheiro das
obras do tribunal em 1998. Em 2001, sempre montado na história do falso
diploma, foi levado pelo ministro Marco Aurélio Mello para o STF, para
assumir a Secretaria de Comunicação Social. Em 2006, ainda pelas mãos de
Mello, passou a ocupar o mesmo cargo no TSE. Nas duas oportunidades,
contratou, sem licitação, a Fundação Padre Anchieta, subordinada ao
tucanato paulista”, apurou.
E acrescenta: “Em 2008, Parente tornou-se o braço midiático do então
presidente do STF, Gilmar Mendes, de quem passou a zelar como se fosse
um capataz. A um repórter, no Acre, que ousou perguntar se Mendes era
pecuarista, Parente ofereceu um pisão no pé. Em 2009, a pedido do chefe,
conseguiu censurar temporariamente um programa da TV Câmara, no qual o autor desta matéria fazia críticas ao seu padrinho e patrão”.
Segundo o Diário Oficial da União, Parente foi exonerado “a pedido”,
em 29 de dezembro de 2011, numa tentativa “desesperada de evitar o
vazamento da informação sobre a fraude funcional”, revela a matéria. “No
mesmo ato, Parente virou chefe de um “Núcleo de Comunicação
Institucional”, que, como o nome indica, não significa nada. Na verdade,
a solução interna achada pelo ministro Dalazen (lembrete: presidente do
Tribunal Superior do Trabalho!) foi fazer com que um subordinado de
Parente, o jornalista diplomado Alexandre Gomes Machado, passasse a
assinar os papéis da secretaria e a responder, jurídica e
administrativamente, por um cargo que não exerce”, disse Fortes. Machado
preferiu não responder à entrevista do Correio do Brasil, por telefone, e pediu que as perguntas sobre as denúncias contidas na matéria de Carta Capital lhe fossem enviadas por mensagem eletrônica.
“O assessor tentou fixar o dia 7 de janeiro como data de exoneração
porque há ao menos um documento interno assinado por Dalazen, datado de 6
de janeiro, para emissão de passagens aéreas e diárias para o
‘secretário de Comunicação Social’ Renato Parente”. O texto, ao qual a
revista teve acesso pelo site do TST, “refere-se à emissão de passagens e
diárias relativas a uma viagem a Caucaia (CE)”, segue adiante a
matéria.
Outro fato que denuncia a ação de Parente, segundo apurou o
jornalista, ocorreu no ano passado. Ele tentava levar a Fundação Renato
Azeredo para o TST, sem licitação, mas foi impedido “pela burocracia,
que o obrigou a realizar um pregão eletrônico”, relata Fortes. “Tropeço
do acaso, algum funcionário da fundação tucana não conseguiu apresentar a
proposta da entidade a tempo, pela internet. A solução encontrada foi a
de melar o processo e impedir que a empresa vencedora, a AP
Comunicação, de Brasília, ganhasse o contrato, orçado em R$ 8,8 milhões
por ano, por cinco anos”.
“A agência vencedora foi enganada: um informe enviado pela internet
depois do expediente deu 15 minutos a ela e a quatro outras
classificadas para apresentar um plano de execução de serviços de
produção de vídeo. Na manhã seguinte, os concorrentes souberam que
tinham sido retirados do processo. A AP, contudo, entrou com um mandado
de segurança para permanecer no páreo, mas Parente nem deu bola. Revogou
o pregão sob a justificativa de que a proposta da agência vencedora era
muito alta. Outra mentira: o edital publicado pelo tribunal estabelecia
o valor do contrato em R$ 10 milhões”, conclui.
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