sábado, 19 de novembro de 2011

Mancha mental

Do Tijolaço

O vazamento de verdade e a "pesca de sardinhas" da Chevron. Imagem e versão aceitas sem contestar
 Passamos uma semana discutindo se o avião era Sêneca ou King Air. Se o Carlos Lupi conhecia o “Senhor Aldair” ou se não o conhecia. O “eu te amo” do Ministro e outras histrionices canhestras que produziu ocuparam minutos e minutos nas redes de televisão e legiões de repórteres foram mobilizadas para levantar cada pormenor de sua atuação.

Muito bem.

Nada contra a imprensa mobilizar todos os seus esforços e abrir todos os seus espaços para investigar irregularidades no serviço público, ainda que não tenha  esteja evidente  senão um comportamento pouco cuidadoso e austero de sua parte.

Dia 10, quando toda a mídia nacional se voltava para o depoimento do Ministro na Cãmara, uma pequena nota da Agência Estado registrava:

“A unidade brasileira da petroleira norte-americana Chevron informou que está trabalhando para conter um vazamento no campo Frade, na Bacia de Campos. “O vazamento se deve a uma rachadura no solo do oceano. É um fenômeno natural”, disse Heloisa Marcondes, porta-voz da Chevron Brasil. “

Nos dias seguintes, toda a imprensa nacional empenhou-se a fundo para provar que o Ministro mentira.

E ninguém se mobilizou para saber o tamanho e a causa do vazamento da Chevron e a investigar o que se provou uma mentira – e escandalosa – da Chevron.

Ninguém da grande imprensa, porque a blogosfera, sem os meios e  as facilidades que ela tem, lutou contra este encobrimento.

Não é possível que os editores de jornal, diante da notícia de que a Presidenta Dilma Rousseff, na sexta-feira, determinou uma investigação rigorosa do caso, achassem que o acidente era uma “porcariazinha”  que vinha de “uma rachadurazinha” no fundo do mar.

Não foi, nos primeiros momentos,  por ordens “de cima”  que o caso foi, na prática, abafado. Foi, o desinteresse – e existiria furor se fosse o vazamento fosse da Petrobras -  que deriva de  uma deformação mental que considera o público  necessariamente corrupto e incompetente, enquanto o privado é limpo e eficiente. Mais ainda, é claro, quando se trata de uma grande multinacional.

Formou-se uma espécie de “mancha mental”, com uma capa impermeável de obtusidade, que aceita como verdades incontestáveis o que dizem as grandes corporações privadas e a lógica do mercado. Nem mesmo as ONGs ambientalistas, na sua maioria, se agitaram. A imprensa publicava “releases”, nada mais.

Durante dias, sem piar, reproduziram-se os comunicados da Chevron, sem contraditório. A foto (única) do vazamento distribuída pela Chevron e a tirada hoje pela fotógrafa Márcia Foletto, de O Globo, mostra bem a diferença entre os faos e a versão da empresa.

Aliás, a Chevron não deu a mínima nem para a imprensa, nem para o Ibama e nem para a ANP.

Não ficaria supreso que seus funcionários tenham ficado sentados na sala de espera, aguardando para serem atendidos.

Aliás, o panorama só mudou porque entrou a Polícia Federal na história.

É curioso – e ao mesmo tempo terrível – que estejamos vivendo tempos de dupla moral e ética. Ao Estado e seus agentes – corretamente – é exigido um comportamento exemplar. Aos grandes grupos privados muito mais poderosos, é o vale tudo.


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