Da Carta Capital
Gabriel Bonis
Europa
‘Grupos xenófobos devem crescer ainda mais’, diz pesquisador britânico
Os movimentos e partidos populistas, ou ultradireitistas, ganharam
força na Europa Ocidental na última década por meio de discursos
personificados contra, entre outros temas, a imigração e o
multiculturalismo. Hoje, esses grupos avançam e conquistam adeptos
divulgando sua ideologia nas redes sociais. É essa ligação quase
desconhecida que o estudo The New Face of Digital Populism (O Novo Rosto do Populismo Digital, em tradução livre), realizado pela organização independente britânica Demos, analisa.
O levantamento pediu a simpatizantes de grupos populistas, que
geralmente se organizam à margem da sociedade e visam representar lemas
conservadores das classes menos favorecidas, de 11 países europeus para
preencherem um questionário.
As mais de 10 mil respostas indicaram, segundo o instituto, o
descontentamento desta parcela da população com governos, sistemas de
Justiça e as elites política e financeira do continente. Aspectos
semelhantes à onda de manifestações internacionais contra o
neoliberalismo, liderada por jovens lembrados como “os indignados”.
“Os movimentos ‘Occupy’ [Ocupar Wall Street, por exemplo]
têm semelhanças com esses grupos no sentido em que ambos são populistas,
desafeiçoados das elites e advogam contra os sistemas político e
financeiro”, diz Jonathan Birdwell, pesquisador sênior do Demos e um dos
autores do estudo, em entrevista a CartaCapital.
No entanto, as similaridades entre os grupos resumem-se apenas aos
aspectos econômicos citados acima, aponta Birdwell. Segundo ele, os 14
grupos analisados, entre eles o Bloc Identitaire (França), CasaPound (Itália) e English Defence League
(Reino Unido), vão além da insatisfação com o sistema capitalista
moderno e acrescentam ao seu discurso ideias xenófobas, típicas da
direita conservadora. Algo que pôde ser captado na pesquisa, pois os
entrevistados mostraram-se contra imigração, o Islã e o
multiculturalismo, por avaliarem que sua identidade nacional estaria
ameaçada. “Mesmo assim é significante o fato de assistirmos ao
surgimento de movimentos populistas em ambos os lados.”
De acordo com a pesquisa, os grupos populistas mapeados são compostos
majoritariamente por homens (75%) e jovens (63% têm menos de 30 anos),
que utilizam mídias sociais online de forma massiva, somando mais de 430
mil seguidores no Facebook. Uma ferramenta de publicidade
ideológica que auxilia esses movimentos a levarem 26% de seus
“participantes virtuais” às ruas em protestos e demonstrações. “É muito
fácil clicar no botão ‘Curtir’ na página da English Defense League,
mas esse resultado é bem mais elevado que a média de cidadãos europeus
de 10%”, diz. “Essas pessoas estão usando a internet e ferramentas
online como uma ponte para estimular de fato outros a se envolverem no
ativismo do mundo real.”
Na migração do universo digital para a realidade, a maioria dos
entrevistados se disse contrária ao uso da violência a fim de alcançar
seus objetivos. Por outro lado, 26% concordaram com atitudes “mais
firmes” para atingir as metas almejadas. “Os apoiadores destes grupos
tendem a ser muito impacientes, impulsivos, energéticos e querem partir
para a ação, mas não creio que vão se voltar exclusivamente para o uso
da violência.”
O pesquisador reconhece, porém, o potencial negativo da retórica dos
movimentos populistas, aos quais atribui a capacidade de criar “lobos
solitários” como Anders Breivik, responsável por um duplo atentado na
Noruega, em protesto à invasão islâmica na Europa, que deixou 77 mortos.
“Alguns grupos combinam um sentido de urgência ao colocar em jogo a
cultura nacional e a identidade dos indivíduos. Usam dados demográficos
para dizer que em 50 anos, os imigrantes muçulmanos no continente serão
maioria e os europeus étnicos minoria em seu próprio país.”
No cenário atual de avanço do populismo, Birdwell afirma ainda não
ser possível prever o impacto desta ideologia nas novas gerações de
cidadãos europeus, mas mostra-se preocupado com o perfil jovem dos
integrantes destes grupos. A pesquisa, no entanto, já reflete um aspecto
contraditório na população mais jovem, na faixa de 16 a 20 anos. Cerca
de 20% deles citaram a imigração como motivo para apoiar movimentos
direitistas, contra apenas 10% dos indivíduos acima de 50 anos.
Apesar de os jovens serem vistos como mais liberais que as gerações
anteriores, o pesquisador destaca a preocupação do setor com os rumos da
economia da Europa e da Zona do Euro. “Caso a situação siga por um
caminho ruim, devemos nos preocupar, pois o apoio a movimentos
anti-imigração e xenófobos vai continuar a aumentar, como é
historicamente comum nestes períodos.”
Desiludidos sobre o futuro de seus países e críticos à União
Europeia, apontada como a responsável pela perda de controle nas
fronteiras, 70% deles não confiam mais no sistema de Justiça. Contudo,
mesmo sem crer também na política, consideram o voto importante. Por
outro lado, 67% votaram na última eleição em partidos populistas, que
alcançaram relativo espaço na Europa. “É importante medir o impacto
destes grupos na política não pelo tamanho que ocupam e sim pela
capacidade de influenciar a elite política com seus discursos”, diz.
Segundo Birdwell, Nicolas Sarkozy, Ângela Merkel e David Cameron já
adotaram o antimulticulturalismo, uma ação que reflete a retórica
populista. “Conforme os políticos de destaque começam a adotar essas
retóricas, vê-se o impacto que esses grupos podem ter.”
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